quinta-feira, 25 de agosto de 2016


15. A Condição do Homem

As atividades do dia a dia do homem, de manhã à noite, não são nada, mas tentativas para alcançar a liberdade. Por uma razão ou outra ele se torna inquieto, e a luta para afastar as causas do desassossego tomam a forma de atividade. Nenhuma pessoa é o que aparenta ser no exterior, e nada no mundo é o que externamente aparenta ser. Tudo se apresenta diferente do lado de fora para a visão e a percepção. Quando alguém está feliz, possui uma tremenda energia: e mesmo que não tenha comido por quatro dias dirá, “Levantarei tijolos!” O homem pode levantar uma pedra e carregar uma árvore, mesmo se tiver sem comer há vários dias, porque ele está feliz por alguma razão. Quão forte são os pensamentos! Na verdade, o pensamento não é uma substância sólida. É um complexo de energia, um campo eletromagnético, um centro de energia, um ponto que pulsa com tal força que nunca permite ao homem ter qualquer descanso. Chegamos a surpreendente conclusão de que nossa felicidade não está em adquirir coisas de forma alguma. É, finalmente, na conquista de nós mesmos.

Todos os pensamentos da mente se ocupam com coisas fora dela, e todo o envolvimento da vida, ou, melhor, dos negócios da vida, pode-se dizer que a preocupação do homem é com tudo que não seja o seu próprio eu. O homem ocupa-se com as coisas externas, sejam elas humanas ou não humanas. A maior dificuldade é de ordem psicológica. O homem vive ou morre apenas por sua mente. Toda a atividade da vida, de manhã até a noite, é como um empurrar para fora de si toda a energia que está em seu interior, e empurrando-a para outra coisa, é como se todo o mundo fosse feito de tudo, exceto o próprio eu! A individualidade não é a verdadeira existência do homem. A chamada individualidade é uma forma falsa que a existência tomou, e ela deseja corrigir este erro tentando expandir-se espacialmente, juntamente com o desejo de perpetuar-se também temporalmente. Portanto, o homem vive uma incessante vida de desejos, pedindo por mais e mais coisas no mundo. Se o sentimento do "eu existo" pode ser dito enfaticamente para ser verdade em todos os estados de experiência, como é que o "eu" existe nesses estados? Qual é a verdadeira natureza do eu que afirma: "Eu sou", e passa por esses estados?


Embora seja verdade que no estado de vigília a associação com o corpo físico seja absolutamente essencial, em outras condições, como o sonho, o indivíduo existe sem o corpo. Isto é estranho! O homem pode existir num sonho sem associar-se com um corpo. O indivíduo não conhece nada no sono profundo, porque não existe objeto externo lá.  Toda vez que o indivíduo fala do conhecimento, ele sempre se refere a um relacionamento entre o sujeito e o objeto.  Mas não é verdade que não exista conhecimento de nenhum tipo no sono profundo. Existe algum tipo de conhecimento, caso contrário como o indivíduo poderia saber que dormiu? No sono profundo, o homem está num estado de total existência pura, e nada sabe sobre o exterior. Não é sequer um ser humano, nem rico, nem pobre, nem sadio, nem doente, não possui sede nem fome. Nada poderia se aplicar a aquele estado do ser, mas ainda assim o indivíduo existe. O homem possui uma característica dupla em si mesmo. Ele não pode ser isolar totalmente do universo. Ele, de fato, pertence a ele. No entanto, ele ainda mantem algum tipo de individualidade, e ele nem sempre pode sentir que é o mesmo que o mundo.

Talvez o homem viva de acordo com seus sentimentos em vez de seu entendimento ou qualquer função psíquica. O homem decide sobre alguma coisa devido a um certo sentimento em si mesmo - lógico ou não lógico. Ele basicamente confirma logicamente o que sente. Os desejos existem para serem canalizados, sublimados, e retornam a fonte original, a partir da forma refletida contorcida que tomam na relação mal calculada com o mundo exterior. Um desejo, enquanto estiver aparentemente direcionado para o cumprimento de uma satisfação objetiva, na verdade surge da necessidade de uma experiência universal. O objetivo da vida é alcançar Deus, a realização do Absoluto, a unidade da individualidade com o cosmos. Isto é moksha. Este é o objetivo final de toda uma vida. O homem não é o que ele aparenta ser no nível consciente. Ele está profundamente escondido debaixo de seu próprio self. Uma casca de sua personalidade está trabalhando com sua consciência em vigília.

O homem atrai aquilo que merece. A lei da Natureza não distribui injustiça arbitrariamente. Existe algum mistério nas coisas que não somos capazes de entender. Temos que suportar algumas dificuldades com força de espirito. Nossas queixas fazem parte de nossa ignorância.

As coisas mais importantes para se lembrar são o propósito colocado diante de si mesmo e o ideal da meta à frente, em seguida, condicionar a atitude geral para a vida.  Se algo está certo ou errado, bom ou mau - como se poderá descobrir? A natureza do objetivo que se escolheu para si mesmo irá indicar o que é certo e o que é errado em qualquer contexto particular. O homem bom é aquele que faz sempre o bem, em todas as condições, e não é condicionalmente bom. Além do bom homem está o homem santo, e ainda acima, o Deus-homem. Nossa vida é um belo modelo de tear, tecido habilidosamente por um Fabricante especializado em todas as coisas, de modo que não se pode facilmente ou inteligivelmente compreender como é feito ou por que é feito.

O mundo, a nossa vida, é mais sutil e está enredada em várias formas de que a nossa inteligência não nos permite compreender. Parecemos estar em posse de algo, um pouco diferente de todas estas coisas, que são os valores finais da existência terrena. Isso é algo que parece que nos fala de dentro e nos faz inquietos. Se estamos inquietos na nossa existência do dia-a-dia, é porque somos feitos de algo que é diferente do que somos constituídos em nossa existência física. Nossos amores e afetos, nossas relações com os outros na forma de gosto e desgosto, tudo são equívocos, raiz e ramo. Todas as nossas atividades, seguem-se a partir dessa análise, são também o resultado profundo de um completo equívoco da vida. Há duas direções ao longo das quais a mente do homem se move, quer dizer, o exterior e o interior. O caminho para o exterior é o caminho do prazer e da diversão. O caminho interior é o da busca da realidade. Satisfações existem de vários tipos. Sempre que estamos totalmente controlados por uma compulsão, libertar-se de suas garras afigura-se uma satisfação. Então, satisfações são inumeráveis, todo montante de liberação de tensão nervosa e psicológica são causadas ​​por um impulso que surgiu a partir do interior. Logo, a mente humana é tola. Ela não entende nada, mas ainda assim assume a arrogância de todo conhecimento e onisciência. Nada pode ser pior do que esta atitude da mente – nada conhece e imagina que tudo sabe. Tal atitude é chamada ignorância. O homem de sabedoria escolhe o que é bem-aventurado e o bem ao invés do que é agradável e satisfaz os sentidos.

A mente humana é tola. Não compreende nada, mas ainda assim assume a arrogância de todo conhecimento e onisciência. Nada pode ser pior do que esta atitude da mente conhecer nada e imaginar que conhece tudo. Esta atitude é chamada ignorância. Às vezes parece estar buscando o objetivo da Realização em Deus quando na verdade estamos perseguindo o que é agradável às necessidades mais profundas do corpo e personalidade dominados pelo ego. Ninguém, ordinariamente falando, pode aspirar a Deus, totalmente. Eras se passaram desde que entramos neste estado de ignorância em que nos encontramos. Mas é como pessoas doentes que estão por anos juntas e se tornaram acostumadas com esse tipo de existência. No início, a doença surge como uma inconveniência. Mais tarde, ela passa a ser como se fosse uma coisa normal. Nossa consciência se acostuma às condições de experiência às quais nos habituamos. Raramente percebemos que a vida pode ser uma escravidão. Estamos tão acostumados a esta estrênua vida de ajustamente com a atmosfera exterior que fazemos esse equivocado esforço por um tipo de alegria e satisfação. A perpétua condição doentia é erroneamente considerada como um estado de saúde normal.

As experiências de nossa vida não são realmente agradáveis. As condições através das quais passamos na mente e intelecto de manhã até a noite não são as de felicidade, mas tentamos fazer o melhor desse próprio sofrimento, e tentamos criar um céu fora do inferno. Sua força está em você. Ela não está fora de você. A fragilidade da personalidade, ou a fraqueza do corpo, não é devida tanto ao contato físico com os objetivos como um ajuste errôneo que tomamos com as condições do mundo exterior. Todos nossos sofrimentos podem em última instância se resumir num erro de compreensão. Qualquer que seja o nível de realidade que estamos, devemos ser mestres nisso. Vida e morte não são fundamentalmente experiências isoladas. Quando a memória persiste, chamamos sono. Quando a memória desaparece, chamamos morte.

Morremos por causa dos desejos, e renascemos devido aos desejos. Os desejos são propulsões de nossa natureza individual para certos tipos de experiência. Quando esses desejos se exaurem pela experiência através desta própria individualidade corporal, o corpo desaparece. A ignorância tem sido uma espécie de felicidade, porque ela traz um tipo errado de satisfação de que o indivíduo é governado pela convicção de que tudo está bem e não há nada errado em nenhum lugar. Se tivermos bastante tempo e paciência para irmos fundo em nossas experiências diárias, perceberemos que há algo abaixo dos movimentos da superfície da vida aos quais chamamos de experiência. Geralmente, são frustradas lá e para cá pelas ondas de nossas atividades diárias, devido as quais deixamos seja por tempo nem a capacidade de ler nas entrelinhas de nossa vida diária. Geralmente não podemos ser felizes neste mundo. Isso é certo, porque a felicidade não é senão uma consequência automática de se alcançar a perfeição. No entanto, quanto mais nos movemos em direção à perfeição, mais nos tornamos felizes.

A pior desgraça é aquela que pensamos que não está lá. É como uma pessoa que se tornou louca, e está possuída por um demônio. Existe um total esquecimento de nossa relação com o Todo. Não somos capazes de conhecer nada nos movendo exteriormente, porque a exterioridade não é a verdadeira natureza das coisas. A finitude da existência individual é totalmente triste. O encarceramento da consciência dentro das paredes do corpo é tão intolerável que o ser finito, em seu intenso desassossego causado por esse aprisionamento no corpo, luta para sair desta finitude. A perda do self é a maior das perdas. Nos perdemos a nós mesmos imaginando que não somos o que realmente somos em relação a natureza do universo. Nos perdemos a nós mesmos imaginando que somos pessoas isoladas. O amor próprio é o maior dos amores, e aqui “self” significa individualidade corpórea. Porque eu tomo a mim mesmo como sendo um indivíduo, eu sou aquele e nada mais. Sinto que preciso preservar aquela individualidade, e eu a amo intensamente. 

Se o indivíduo for um pouco filosófico e desapaixonado em sua análise, ele perceberá que não são as pessoas e coisas exteriores, mas ao contrário seu próprio relacionamento com essas pessoas e coisas que constituem seu problema. Podemos ser pessoas devotadas, mas mesmo assim, nossa devoção a Deus é na maioria das vezes pela metade, relutante e indiferente. Tal devoção indiferente não pode trazer sucesso, e certamente não traz sucesso rápido.

Mesmo as piores das coisas passarão, e ninguém estará sempre na mesma condição. O indivíduo poderá estar oprimido, e talvez sentir pressionado sob o peso deste moinho do mundo. No entanto, ninguém pode ser moído totalmente. Existe algo em todos que é imperecível.

As coisas evitáveis na vida seguem aonde formos, e pode não ser tão difícil para qualquer buscador se libertar do envolvimento de coisas que não são essenciais. Primeiro e acima de tudo o que devemos fazer é descobrir o que é essencial e o que não é essencial na vida.

Não somos apenas cidadãos de Nova York, Delhi ou mesmo desta Terra. Temos um passaporte para entrar em vários planos da existência. Portanto, temos uma obrigação de transcender os limites e fronteiras da nação e sociedade em que nascemos.
Estamos a cada momento em tempo centrífugo e também centrípeto; ou seja, possuímos um impulso internalizado em direção à atividade, relacionamentos sociais e contatos de vários tipos, e ao mesmo tempo temos um poderoso impulso de manter nossa integridade e condição. Nossa razão não é forte, nossa compreensão é débil, mas nossos sentidos são vigorosos e impetuosos. Nossas atividades não precisam nos trazer felicidade. Nós baixamos ao estado de total desesperança e miséria, porque não encontramos tempo para caminhar com a luz da razão e a justiça do universo. Não podemos ver esta lei com nossos olhos, assim como não podemos ver, por exemplo, um governo. No afazer que somos chamamos a realizar, existe em tal coisa como uma obrigação superior ou inferior. Tudo tem o seu papel a desempenhar. Existem medos de vários tipos que nos mantém infelizes em segredo, e muitas das tentativas da vida no nível consciente são tentativas para deixar de lado esses medos. Nos ocupamos tão ativamente com trabalhos de vários tipos como uma forma de saída ou contra-ataques contra nossos medos, e isto é usualmente conhecido na linguagem da psicologia como “mecanismos de defesa”.

Você deve obrigação de vários lados à vida humana – aos seres humanos, aos seus ancestrais, aos deuses celestes, aos sábios, e mesmo às bestas e animais. Você possui obrigações, não direitos, neste mundo. Direitos automaticamente o seguirão sem você pedir por eles. Quando você realiza suas obrigações, você não precisa demandar seus direitos – eles surgem espontaneamente. Quando não mais nos considerarmos como vítimas indefesas nas mãos do isolamento do tempo e espaço, nós então nos tornaremos seres universais participantes do objetivo do Cosmos. Então isto é o que recebemos da Graça de Deus, pois Deus é não espacial e não temporal. Este nosso pequeno self é como um asno carregando um tesouro em seu lombo sem saber o seu valor! Imagine por um instante: quem está completamente feliz e satisfeito neste mundo? A tristeza corrói as vísceras da natureza humana, e ela é caiada por uma mancha de afirmação egoísta de adequação de si mesmo. Que você não seja capaz de encontrar uma única pessoa totalmente satisfeita no mundo é uma questão para profunda consideração.

Quando vejo uma pessoa a minha frente, o que penso dessa pessoa? Muitas ideias surgem: esta pessoa veio de Nova York, ela é filha de fulano, trabalha naquele escritório, é bem-educada. O nome da pessoa e forma são como isto. Que outras tantas coisas posso pensar sobre a pessoa? Mas nada dessas descrições realmente são aquela pessoa. O envolvimento das personalidades humanas é de tal forma intrincado e quase além da imaginação que, normalmente, talvez não tenha sucesso nem mesmo com anos de prática. Mas o esforço persistente trará seus próprios resultados.

(Tradução Livre - sivanandaonline.org)

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